domingo, 26 de abril de 2020

NINHO DE MORTEIRO - FEB.



Coronel Sérgio Gomes Pereira 
Meu Capitão Comandante de Companhia era uma figura, vamos dizer, inusitada. Chamava-se João Manoel de Faria Filho. De baixa estatura – Apelidamos ele de “Giovanni Piccolo” (Giovanni, o pequenino) . Porém era um homem de bravura pessoal a toda prova. Em várias ocasiões, quando a presença do Comandante de Companhia não era aguardada, ele aparecia.
O Subcomandante era o Primeiro-Tenente Nicolau José Seixas, já falecido. Em campanha, como é de regra, é o resposável pelo apoio logístico. Eu vou me permitir contar esse episodio, que é folclórico e absolutamente verdadeiro.
Relatórios de patrulha, inclusive de algumas feitas por mim, e por companheiros meus, não conseguiam informar a localização exata de determinadas posições de metralhadoras e morteiros. Numa dada ocasião, o Seixas disse: “Eu vou lá, levantar onde estão essas posições”, e repetiu num tom decidido: “Eu vou lá.”então, ele fez uma coisa contra as leis da guerra. Nós usávamos um uniforme completamente heterodoxo: parte seguia nosso regulamento; parte o estadunidense.
Debaixo do capacete usávamos um “gorrinho” de lã, para proteção contra o frio. Ele tirou o capacete, vestiu paletó civil, colocou um chapéu na cabeça, apanhou um peru vivo, isso mesmo, um peru vivo, e, sob a ave, uma metralhadora.
Transmudou-se num sfolatti, italiano desalojado pela guerra, que migrava de um lado para outro – uma espécie de refugiado. Nessas condições, atravessou a linha de frente e foi conversar com os alemães.
Acontece que o italiano dele era “macarrônico”, assim como o dos alemães, não dando a perceber que se tratava de um brasileiro. A verdade é que ele conseguiu descobrir o motivo dos erros de localizações das armas alemãs, que era o seguinte: havia aqueles cones de feno – chamados “medas” – preparados para a alimentação dos animais na época do inverno. Os alemães cortavam a vértice do cone, de maneira que ficava um abertura e, no interior, instalavam uma posição de morteiros. Atiravam e não se conseguia identificar as peças que realizavam o disparo.
Mais tarde, esse detalhe passou a nos chamar a atenção. Quem já viajou pela Europa, pode reparar que essas “medas”, hoje, são enroladas. Não precisa dizer que o Seixas teve que botar o “pé no mundo” e voltou para as nossas linhas, dando todas as informações. Recebeu, por essa ação, a silver star(estrela de prata), condecoração de guerra do Exército Americano.
Coronel Sérgio Gomes Pereira
Comandante do 2º Pelotão de Fuzileiros da 8º Companhia do III / 11º RI

Matéria: ANVFEB

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