segunda-feira, 25 de junho de 2012

CABO CLARINDO, PADIOLEIRO DA F.E.B.


A história desse bravo pracinha está ligada diretamente à queda de Capella IL Monte a 13
de março de 1945. É fato que ler ou ouvir relatos de técnicas de combate, estratégias ou
até mesmo a visão do conflito de algum militar mais graduado é muito interessante, mas
nada mais emocionante que ler ou ouvir fatos de quem viu a cara da guerra, que na linha
de frente, sentiu o incômodo do barulho e o estrago infernal de tiros da artilharia inimiga,
do som terrível das metralhadoras que feriam e ceifavam a vida de companheiros que até o
minuto anterior estava tão vivo quanto ele e que agora não passa de uma semente que vai
ser plantada no cemitério militar. A história desse bravo guerreiro mais uma vez prova que
realmente nossos pracinhas viram a guerra bem de perto com todos seus horrores. E assim,
atentemos para o relato do Cabo Clarindo:

Um pouco sem jeito no meio de Coronéis, Majores, Capitães, Tenentes e a imprensa, com
um sorriso tímido, o Cabo padioleiro Clarindo Batista dos Santos, um pernambucano de Bom
Conselho que fez parte do exército da borracha antes de ser chamado às armas, começa a sua
história:
Chamado pelo comandante do Batalhão, o Major Uzeda, para contar um dos feitos mais
empolgantes vivido pelos pracinhas brasileiros na guerra da Itália: Uma patrulha avançada do
1º RI percorria uma área próxima à Valpiana, quando, sem que sem membros esperassem,
vieram ao seu encontro três alemães que queriam se entregar. E assim foi feito. Levados ao
posto de comando, revelaram a posição de uma pequena fortaleza localizada em Capella IL
Monte e deram indicações suficientes, o que permitiu que a artilharia concentrar tiros de
canhão e morteiros na posição inimiga.Seis desse tiros atingiram o alvo em cheio. A patrulha
aguardava o desenrolar dos fatos que não se tardaram a acontecer e de maneira rápida. Em
meio aos escombros fumegantes da pequena fortaleza, foram vistas duas bandeiras: Uma
branca em sinal de rendição e a da Cruz Vermelha que indicava a existência de feridos.
Imediatamente o fogo foi suspenso. Nesse instante é que se inicia história do Cabo Clarindo:
O capitão Farah pediu que um voluntário se apresentasse pra ir ao encontro dos nazistas que
continuavam a acenar as bandeiras. Prontamente, apresentou-se o nosso protagonista. Muitos
outros também se ofereceram , mas era o tipo de trabalho que exigia o empenho de um
homem só. Seguem agora, as palavras do próprio Cabo:

“ Eu parei a poucos metros dos tijolos e arames farpados. Um graduado veio até a cerca e
disse que ele tinha dois mortos e um ferido por consequência do bombardeio brasileiro. Por
meio de gestos e falando um pouco de italiano, perguntei quantos homens havia lá dentro
para se entregaram. Compreendendo o que eu quis dizer, foi consultar seus companheiros.
Vi no canto de uma das casas três tedescos cavavam a terra para dali, retirarem os mortos.
Peguei uma pá e comecei a cavar também só para despistar. Não demorou muito, vi que um
oficial também estava no meio daqueles homens e assim que me viu veio a passos lentos em
minha direção e falou em italiano : ‘Onde está seu chefe?’. Respondi: ‘Logo ali’, apontando
para atrás de uma pequena colina. O Tenente perfilou-se e fez a saudação hitlerista e me
estendeu a mão, que cautelosamente, eu apertei. Logo após percorri outras casamatas afim de
levar mais algumas informações ao meu capitão para que levássemos logo aqueles alemães dali.
O mais importante da história foi quando me aproximei da maior construção do lugar, a
Capella IL Monte, onde deitados ou sentados havia cerca de 15 inimigos que se assustaram de
pronto quando viram que eu era um pracinha brasileiro.
Vi então, que a coisa ali era mais séria que eu pensava e resolvi sair dali o mais rápido possível,
para trazer reforço e dominar aquele grupo de tedescos. Confesso que a a principio fiquei
com medo que eles me segurassem e não me deixassem voltar, mas quando comecei a voltar
para onde estavam meus companheiros, eles não esboçaram nenhuma reação de hostilidade.
Eles pareciam estar completamente desorientados e sentindo que o fim da luta estava
próximo. Covenhamos também, que eles não tiveram tempo de raciocinar pois tudo isso não
levou mais de dez minutos ! Foi com alegria que depois de dar alguns passos, vi aparecer
em uma curva três homens do Corpo de Saúde e dois metralhadores. Voltamos correndo e
ainda encontramos os alemães na mesma situação de desespero. Quando viram que mais
gente chegava , ainda tentaram pegar suas armas, mas nosso pessoal foi mais rápido e em
um minuto, fuzis, granadas, sabres e punhais foram recolhidos. Então, eu e outro padioleiro
resolvemos cavar, juntamente com os alemães, para retirar os mortos dos escombros.
Alguns alemães escaparam da nossa vista e conseguiram chegar a um canto do barranco.
Parecia que eles não concordavam em se renderem e resolveram nos pregar uma peça. O
pracinha metralhador correu e encontrou pouco adiante, os dois nazistas que tentavam
municiar sua “lurdinha”, mas quando viram o metralhador em posição de taque. Levantaram-
se e juntaram-se aos outros. Resolvi tomar o comando devido à situação que se apresentava
e ordenei que os alemães fossem postos a caminhar em direção às nossas linhas. Outra
situação difícil que enfrentamos, foi quando dois SS apareceram esbravejando, levantando os
punhos e se dirigiram ao Tenente que resmungava de modo inconsolável. Ficaram discutindo por
alguns instantes até que eu os empurrei com o cano de uma metralhadora que eu havia pego
das mãos de um tedesco, com isso, eles compreenderam que eu seria capaz de matá-los ali
mesmo caso não se decidissem! Caminharam devagar até onde estava a maioria sob a guarda
dos metralhadores e padioleiros. Acomodamos um ferido que encontramos semi soterrado
pelo desabamento da casamata; este estava inconsciente, completamente alheio ao que se
passava ao seu redor.

Foi então que os teimosos SS negaram-se a nos acompanhar e fui obrigado a encostar a
metralhadora no ouvidos deles, fazendo com que desistissem de qualquer tipo de resistência.
Tomamos o caminho do nosso PC com 23 prisioneiros e dali em diante, eles não esboçaram
qualquer tipo de atitude suspeita porque sabiam que estariam em maus lençóis! E então,
fomos andando ouvindo ainda os gritos do Tenente que também não parava de gesticular a
cada passo dado. A impressão que tive , é que ele não queria parecer desmoralizado perante
seus homens. Confesso que fiquei com pena quando começaram a chorar, lamentando o
fracasso da missão a eles confiada. Agora, estavam a caminho das linhas inimigas como
prisioneiros de guerra.
Braçadeira de padioleiro da FEB.
acervo O Resgate FEB
Desde a minha chegada a Capella IL Monte até o momento de voltar com os prisioneiros,
decorreram exatamente 40 minutos. mas esses minutos pereceu-me dias inteiros ! Por fim
chegamos ao PC onde nossos companheiros nos aguardavam. Passados uns poucos minutos,
eles ocupavam Capella IL Monte. Eu tinha ido observar, mas achei melhor ver a coisa de perto.
Foi isso que aconteceu! Porém, devo confessar que senti um frio percorrer todo meu corpo
quando percebi que não saberia manejar a metralhadora alemã caso fosse necessário! Se os
tedescos soubessem .....”
Esta foi a aventura dramática do Cabo Clarindo.
Os 23 prisioneiros não devem ter compreendido como um homem só, que chega
completamente desarmado às suas posições e consegue terminar com a guerra em Capella IL
Monte.
É verdade que a bandeira branca tinha sido içada, porém, nem todos estavam dispostos a se
renderem, portanto, grande risco correu o nosso herói !

Matéria do colaborador do blog Hélio Guerrero
Adaptado do texto "Capella IL Monte ocupada" do livro A LUTA DOS PRACINHAS, Joel Silveira e Thassilo Mitke, Editora Record

Nenhum comentário:

Postar um comentário