quarta-feira, 25 de maio de 2016

O Herói Esquecido da F.E.B

'Edgard Silveira Nunes, nasceu em Tupanciretã, no Rio Grande do Sul,no dia 12 de setembro de 1926. Foi abandonado pelo pai e a situação complicou quando sua mãe morreu quando ele tinha cinco anos de idade. Adotado pelo tio materno e cansado dos maus tratamentos, fugiu de casa aos 12 anos para o Rio de Janeiro, na esperança de uma vida melhor. Aos 16 anos, se alistou como voluntario na II Guerra Mundial, no 6° Regimento de Artilharia Montada, partindo para a Itália no 5º Escalão, no dia 8 de fevereiro de 1945, a bordo do navio General Meigs e desembarcando em Nápoles, no dia 22 de fevereiro.“ Lembro que naquele dia estávamos em um treinamento dentro do navio americano, em alto mar, depois de algum tempo fomos avisados que não era um treinamento, mas que estávamos partindo para a guerra. Começamos a passar mal," contou ele.
Edgard Silveira Nunes
"Não sabemos com exatidão em que batalha nosso pai combateu. Tampouco sabemos ao certo como conseguiu as marcas de balas que tinha no corpo. O pouco que sabemos eram frases curtas, que saíam como se tivessem escapado, sem intenção. “Sem detectores de minas, mas precisando passar por determinada área, estava em um jeep com um amigo tenente, fomos vitimas de uma mina que explodiu e o tenente morreu mutilado. Eu sai ferido na cabeça.”
As únicas evidências da sua passagem no palco de operações na Itália são o diploma da medalha da Cruz de Malta, a bênção do Papa João XXIII, as fotos com amigos e uma profunda tristeza que o acompanharia até a sua morte em 2001. Pesadelos, dores de cabeça, alucinações, insônia, agressividade e comportamento auto-destrutivo. E neste “front” não se esperam homenagens, desfiles e medalhas, mas somente um grande vazio, sofrimento e recordações difíceis de esquecer.
Mas as pessoas querem fatos históricos. Quando éramos crianças também queríamos que ele nos enchesse de histórias sobre a campanha na Itália. Mas nosso pai era prisioneiro de suas recordações e segredos dos campos de batalha. Por que ele não desfilava junto aos outros pracinhas durante a semana da Pátria? A resposta se mantém clara na nossa memória: “Não tenho nada para me orgulhar. Se existem heróis, esses estão entre a população civil”. Desde então, nunca mais foi possível observar essa e outras histórias sem que pensasse em pessoas. Muito além de estratégias, deslocamentos de pelotões, tecnologias empregadas, número de baixas. As vezes achamos que nosso pai também foi vitima de incompreensão social, pois para ele retornar a vida “normal” depois de uma experiência deste tipo, ele precisou continuar se sacrificando, sozinho com as suas dificuldades para voltar à vida civil.
A história do nosso pai é interessante por revelar uma face humana diante do que foi a campanha da Força Expedicionária Brasileira - FEB na Itália, para além das estratégias e planos de combate. A sua grandeza está na capacidade de nos lembrar que é preciso haver espaço para as diferentes experiências vividas naquele momento. Uma história sobre essa expedição que não dê voz àqueles que recorreram ao silêncio como forma de amenizar o sofrimento não será uma história justa'."
Créditos: Márcia e Magda Villanova Nunes / FEB: O Herói Esquecido

segunda-feira, 16 de maio de 2016

Pracinha Antônio Milioli

Carteira de sócio da Associação Nacional dos Veteranos da FEB, seção regional de Florianópolis/SC, do pracinha Antônio Milioli que participou da Segunda Guerra
Doação do amigo Rodrigo Ronzoni de Criciúma para o acervo O Resgate FEB.


(clique na foto para ampliar)

segunda-feira, 9 de maio de 2016

O pracinha de Montese

Muito interessante esta matéria do amigo Ricardo Moojen Nácul publicado no facebook: História Militar e Militaria Brasileira (HMMB).

"Achei na internet uma imagem do momento que foram retirados os ossos do último soldado brasileiro da FEB localizado na Itália. O soldado de pé e testemunha deste ato era o Subten/R1 Miguel Pereira, nosso eterno guardião de Pistóia. Este soldado, que não foi possível identificar, esta enterrado no santuário Monumento Votivo Militare Brasiliano di Pistoia com o título de”Soldado Desconhecido”.
Pesquisei mais a fundo e achei um trabalho - A “magia” do soldado desconhecido: rituais fúnebres militares - de Adriane Piovezan que explica tudo, e agora divido com vocês"(Ricardo Moojen Nácul )

"De acordo com os relatos consultados, sua origem remonta à inauguração do Monumento Votivo em 7 de junho de 1966.Na ocasião da inauguração do Monumento, o prefeito fez saber às autoridades brasileiras da existência de uma antiga sepultura próxima ao centro da cidade de Montese, na qual civis italianos teriam enterrado um soldado brasileiro, morto no decorrer da batalha pela posse daquela localidade em meados de abril de 1945.
A Embaixada Brasileira em Roma organizou então as atividades de exumação e recuperação do corpo, provavelmente usando seu próprio pessoal, além de meios materiais e humanos contratados. Tratava-se de um contexto no qual havia tempos não eram mais encontrados corpos de brasileiros. Os que foram localizados, já haviam há anos sido transferidos para o Cemitério Militar Brasileiro em Pistoia e, de lá, transladados em 1960 ao Rio de Janeiro, a fim de serem reunidos no Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial naquela cidade. Seria de se esperar que esse corpo tivesse o mesmo destino, uma vez que com a conversão do antigo Cemitério em Monumento o local já não exercia qualquer função cemiterial. Contudo, a destinação final do corpo deveria ser, necessariamente, precedida pela sua identificação.
Os trabalhos se iniciaram a 3 de maio de 1967, com a remoção de árvores e de uma camada de terra de cinco metros de profundidade, a qual cobria o túmulo. Todo processo foi acompanhado por um grande número de moradores locais que a tudo assistiam.
No Cemitério de Montese, o Subtenente Miguel Pereira, da 
reserva do Exército, identifica e recolhe à urna os restos mortais do “pracinha”, que permaneceu sepultado 22 anos numa ribanceira na orla de Montese. Os “velhos” da cidade, que assistiram ao combate de 14/04/1945, guardaram silenciosamente a sua sepultura, até entrega-lo ao Brasil em 23 de maio de 1965. Foi a Força Expedicionária Brasileira (I/11 RI – Batalhão Carvalho Lisboa) que libertou a Cidade de Montese, naquela jornada, de quatro anos de ocupação alemã.
É de se notar que a legenda (foto em enxo) estabelece uma ligação entre aquele morto e a população da cidade ao afirmar que os “velhos” da cidade, que assistiram ao combate de 14/04/1945, “guardaram silenciosamente” a sua sepultura, até entrega-lo ao Brasil em 23 de maio de 1965. O que se percebe claramente é a forma pela qual o enterramento desse soldado 
pelos civis italianos à época da guerra é descrito. Não foi uma solução de emergência, face às contingências impostas por uma época de extensos e violentos combates. Mas sim o resultado da relação estabelecida entre o combatente brasileiro e aqueles a quem – com o sacrifico da própria vida – ele enfim, libertou do jugo nazista. Também não se considera que se tratava de uma iniciativa isolada ou desprovida de sentido.
 O que um conjunto de moradores daquele local buscou – a tomar ao pé da letra essa legenda – foi dar sepultura ao mesmo tempo segura e apropriada (“guardaram silenciosamente”) até que o corpo pudesse ser entregue à Pátria de origem (“até entregalo ao Brasil”). Finalmente, o sentido último da presença dos brasileiros na Campanha da Itália durante a Segunda Guerra Mundial – a libertação da Itália do jugo nazista – é lembrada: “libertou a Cidade de Montese, naquela jornada, de quatro anos de ocupação alemã”.
"No Cemitério de Montese, onde se encontravam recolhidos a uma urna, os restos mortais do “Pracinha de Montese”, desde a exumação em 23/05/1967, realiza-se a entrega ao representante da Embaixada do Brasil, pelo prefeito da Cidade, depois de reconhecida, pelas autoridades italianas a nacionalidade brasileira. A urna, em madeira de lei, com alças de bronze, foi oferecida pelos marceneiros e artífices de Pistoia. Foi transportada para Pistoia, onde foi recebida pelo General Floriano de Lima Brayner, autorizado pelo Presidente da República e pelo Embaixador Dr. Alamo Louzada, para o definitivo sepultamento. Montese e Pistoia, 05/06/1967."
"Na ausência de qualquer identificação, os restos mortais passaram a ser conhecidos como o do “Pracinha de Montese”. É de se notar que, desde a época da guerra, os membros da FEB eram carinhosamente referidos pela população civil brasileira como os “pracinhas”, isto é, o diminutivo de praça, que é a palavra que designa os militares de mais baixa patente, por exclusão, aqueles que não são membros do oficialato. A batalha de Montese foi a mais cara e a mais difícil das travadas pela FEB.
Ao identificar o corpo como associado à localidade, se evoca o sacrifício suportado por todos brasileiros na libertação daquela cidade da ocupação alemã."
"Depois de um ano de pesquisa, o Guardião do Monumento, Miguel Pereira, conseguiu localizar os restos exatamente no local indicado, achando provas que não deixavam dúvidas quanto à nacionalidade dos restos e sim sobre a identidade certa de quem podia ser o corpo, entre os ainda 15 desaparecidos. A decisão de deixá-lo repousar no Monumento, enquanto Desconhecido, e então representando todos os irmãos tombados no cumprimento
do Dever, transformou o local – de fato – num Sacrário."
QUEM ERA:
"E, aos cinco metros de profundidade foi encontrado sob as vistas de inúmeras pessoas, e farta documentação fotográfica.
Reunidos os restos mortais num caixote, foram levados para o Cemitério de Montese, onde eu os revistei minuciosamente, não encontrando a placa de identificação. Na arcada dentária dos maxilares superior e inferior faltavam alguns dentes. No hemitorax esquerdo havia uma ogiva de morteiro, 60 alemão. Através pequenos objetos; botões, fio, foi por mim reconhecido
como brasileiro, ficando a identidade para ser apurada mais tarde. [...] ao mesmo tempo que envidavam-se esforços para se obter a identificação do “Pracinha Desconhecido de Montese”, através das unidades em que servia[...] Dois outros, do III Bat. do 11º R.I., foram encontrados em sepulturas fora dessa área e levados para o Cemitério de Pistoia, devidamente identificados. Um deles, Rubens Galvão, tinha a placa de identidade no pescoço; outro, não a possuía, mas, na mesma sepultura ao lado do corpo estava uma garrafa, e dentro dela um papel em que se lia o nome, Júlio Nicolau o número e a unidade daquele combatente. Quem escreveu nunca se ficou sabendo, pois o autor deve ter ficado com a placa. O terceiro extraviado, publicado no Boletim da Unidade de 16 de abril de 1945, chamava-se Fredolino Chimango, natural de Passo Fundo, Rio Grande do Sul."
"Vinte e dois anos depois, outubro de 1967, 11 horas de uma manhã rebrilhante de sol, na cidade de São João del Rey, na caserna do 11º. RI, na sua praça d´armas, o Regimento todo reunido, em posição de sentido, erético, emocionado, preparava-se para ouvir a evocação do Combate de Montese e, em seguida receber das mãos do antigo Chefe de Estado Maior (Lima Brayner), da Divisão na guerra, uma bela caixa contendo terra de Montese, colhida no local em que esteve inhumado durante 22 anos o Cabo Fredolino Chimango, e que lhe fora enviada pela 
população da cidade sempre agradecida à unidade brasileira que a libertara dos seus tirânicos ocupantes. Ali estava, presidindo a cerimônia, o Comandante do I Exército. Cabelos grisalhos, pele já apresentando as primeiras marcas da idade, o General de Exército Manoel A. Carvalho Lisboa, o bravo conquistador de Montese. Suportou com serenidade, os olhos embaciados de lágrimas, o impacto da saudade. Os jovens soldados, rígidos e traumatizados, em forma, ouviram as ordens de combate, as manobras e aflições dos pequenos comandos contados pelo célebre Tenente Iporan que foi o primeiro a entrar em Montese, hoje coronel reformado. Ali estava em traje civil, o peito coberto de medalhas. Dois jovens soldados, em meio às emoções, caíram desmaiados. (BRAYNER, 1973: 114)"
"Fora de qualquer dúvida é que o reconhecimento do corpo foi realizado, e embora jamais tenha sido contestado ou refutado, segue sem ser formalizado pela instituição militar. Na ausência de mera autorização, o único corpo ainda sepultado no Monumento Votivo de Pistoia segue cultuado como sendo do Soldado Desconhecido. Correspondentemente à essa linha de ação, o corpo do Cabo Fredolino Chimango segue sendo dado como “não-identificado”, “desaparecido” ou “extraviado”. É o que se lê na inscrição de mármore no Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial no Rio de Janeiro (RJ), como pude constatar em diferentes visitas que fiz ao local no 
decorrer dessa pesquisa. Lima Brayner é bastante enfático ao denunciar esse procedimento, que considera injusto. Segundo ele: Um dia Fredolino voltará, também, para ficar, a sua linda urna, homenagem da cidade de Pistoia, ao lado das outras que já se encontram no Flamengo. E naquele mármore do Salão da Urnas se apagará, para sempre, a triste palavra – “Extraviado” – (sic) que tanto pode significar “desertor” como “prisioneiro”. Ele que todos viram lutando leoninamente... A ele que promoveram por bravura e condecoraram “post mortem” chamaram de “extraviado” só porque não viram onde ele caiu, com um estilhaço de granada no peito? – É uma injustiça. (BRAYNER, 1973:115)".

Fonte: http://www.snh2015.anpuh.org/…/1441910406_ARQUIVO_adriane.p…